09/09/2008 -
Senado aprova projeto que regulamenta escutas telefônicas
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira, em segundo turno de votação, projeto que regulamenta as escutas telefônicas. A aprovação veio apenas depois de muita discussão sobre o prazo para que escutas legais sejam autorizadas. No final, prevaleceu o que estava previsto no substituto, e as autorizações poderão chegar a 360 dias. A proposta agora será encaminhada à Câmara dos Deputados.
Os senadores Francisco Dornelles (PP-RJ) e Marconi Perillo (PSDB-GO) se posicionaram contra o item referente ao prazo da escuta. Segundo o projeto, a autorização pode ser concedida por 60 dias, prorrogáveis por mais 60, até o limite máximo de 1 ano. O pedido de prorrogação deverá ser fundamentado e passará pela Justiça.
Os dois senadores consideraram o prazo longo demais e propuseram um período de 15 dias, prorrogáveis por mais 15, até o limite de 45 dias. A maioria, no entanto, considerou o prazo proposto extremamente curto. Ao defender o período de até um ano, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) alegou que a questão foi discutida com especialistas do Ministério da Justiça e que um prazo menor inviabilizaria determinados tipos de investigação.
"No caso de seqüestro, tráfico de entorpecentes e de corrupção em licitações, por exemplo, a investigação se inviabiliza. 15 dias é um período protocolar, não dá nem tempo de analisar o pedido de autorização", disse o senador.
Além de Perillo e Dornelles, contudo, outros parlamentares manifestaram preocupação com o que consideraram um período extenso demais para que se realize escutas legais. Antônio Carlos Júnior (DEM-BA) defendeu um prazo menor "para evitar abuso". "Eu acho 360 dias extenso demais, porque os juízes não avaliam, não vão à fundo saber se devem autorizar a escuta ou não. Então, essas autorizações vão ficar sob o arbítrio das polícias e do Ministério Público", alegou.
O substitutivo aprovado pela comissão resultou de um projeto original do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), que sofreu alterações do relator Demóstenes Torres (DEM-GO) a partir das consultas feitas ao Ministério da Justiça.
Pena de até 7 anos e meio para servidores
Ao longo da sessão, várias propostas foram apresentadas para se chegar a um acordo - incluindo uma que previa o prazo máximo de seis meses -, mas no final prevaleceu o que estava previsto no projeto. Minutos antes da votação, contudo, foi acatada parcialmente outra idéia defendida por Perillo. As penas aplicadas a quem violar o sigilo telefônico sem autorização judicial passaram para 2 a 5 anos, quando inicialmente iam de 2 a 4 anos. Em caso de servidores públicos, o projeto prevê aumento de 50% na punição e, com isso, um agente público pode ficar até sete anos e meio em reclusão.
O senador Perillo queria dobrar as penas, que passariam a ser de 4 a 8 anos de prisão. Com isso, em casos extremos, um servidor público poderia ficar 12 anos preso. A idéia, contudo, foi considerada inadequada pelos demais parlamentares. "Elevar a pena a 8 anos a deixaria muito elevada, seria a mesma de homicídio", argumentou Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), autor do projeto.
Ao final, o senador Dornelles registrou sua insatisfação pelo resultado da votação, afirmando que se considerava "derrotado" na questão referente ao prazo de autorização das escutas.
Comercialização de equipamentos de escuta
Mais cedo, a Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática do Senado já tinha aprovado um projeto de lei que obriga os fabricantes e comerciantes de equipamentos de escuta telefônica informar à Polícia Federal sobre as vendas dos produtos. A matéria ainda será analisada pela CCJ.
A proposta inicial do senador Romeu Tuma (PTB-SP) citava que os fabricantes teriam de fornecer os dados. O relator, senador Cícero Lucena (PSDB-PB), incluiu na proposta os comerciantes. "Assim, aqueles que importam e comercializam também serão obrigados a fornecerem as informações", justificou o relator.
O senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), ao comentar a matéria, sugeriu que na CCJ seja apresentada uma emenda "para tornar crime hediondo o porte e a venda ilegal desses equipamentos".
Repetições
De certa forma, contudo, o que o Projeto de Lei 741, de 2007, prevê é algo que já foi incluído no projeto aprovado em caráter terminativo pela CCJ e que será encaminhado para a Câmara. O artigo 26 determina que "é proibida a comercialização de equipamentos destinados especificamente à interceptação, escuta, gravação e decodificação de comunicações telefônicas, incluindo programas de informação e aparelhos de varredura (...) sendo obrigatório o registro no órgão competente". É deste registro que trata o projeto apreciado pela Comissão de Ciência e Tecnologia.
A questão da responsabilização de agentes públicos também incluída no projeto aprovado nesta quarta pela CCJ, era uma preocupação do Presidente da República. Ao afastar a diretoria da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), no dia 1º de setembro, depois de denúncia de escuta clandestina que teria atingido o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO), o presidente fez outras recomendações.
Em nota oficial, determinou ao Ministério da Justiça a "elaboração, em conversações com o Supremo Tribunal Federal, de projeto de lei que agrave a responsabilidade administrativa e penal dos agentes públicos que cometerem ilegalidades no tocante a interceptações telefônicas". A questão é tratada em um anteprojeto de lei que está sendo analisado pela Casa Civil, antes de ser encaminhado ao Congresso.
Para resumir as diferenças entre os dois projetos, o que foi aprovado pelo Senado e o que está sendo avaliado pelo Executivo, o assessor legislativo do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay, diz que o primeiro cuida da escuta legal e o segundo, das ilegalidades. "No mais, eles são complementares", afirma.
A nota divulgada pela Presidência da República também pedia a "aprovação rápida" do Projeto de Lei 3272, de 2008. De conteúdo semelhante ao que foi aprovado pelo Senado, ele também regula as interceptações telefônicas. Segundo Abramovay, a proposta, que tramita na Câmara, "deverá ser apensada (em conjunto)" ao projeto que já está mais adiantado.
"Este é o projeto mais abrangente, o mais abrangente, porque teve a participação de uma comissão de três delegados e três procuradores que fez uma análise técnica da matéria", argumenta o assessor do Ministério da Justiça.
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