A polícia informou nesta segunda-feira (16) que um tenente, um sargento e um soldado suspeitos de terem participado da morte de três jovens detidos pelo Exército no sábado (14) no Morro da Providência, na Zona Portuária, confessaram em depoimento que levaram as vítimas para o Morro da Mineira para serem punidos.
Segundo a delegacia, o conteúdo dos três depoimentos é muito parecido e não apresentam contradições. Eles contaram que abordaram os jovens porque perceberam que um deles estava com algo debaixo da camisa e preso na cintura. Eles suspeitaram que fosse uma arma e abordaram os três.
Durante a revista, houve confusão, e os militares levaram os jovens para a Delegacia Judiciária Militar, na região do Santo Cristo, para atuá-los por desacato. Na ocasião, o capitão que era o responsável pelo local não quis autuar os jovens, e pediu para liberá-los.
No entanto, os militares levaram os jovens para o Morro da Mineira, onde, segundo a polícia, a facção criminosa é inimiga dos traficantes da Providência, onde moravam as vítimas.
De acordo com a delegacia, os militares entregaram os jovens aos traficantes da região, e saíram em seguida. Eles não cobraram dinheiro ou favor dos criminosos ao entregar as vítimas.
"Durante o depoimento, deu para perceber que os militares não tinham noção das consequências. Eles queriam dar um corretivo nos jovens. O tenente é do Espírito Santo, e estava no Rio há pouco tempo. À princípio, todos os 11 responderão por homicídio", disse um dos agentes que participa da investigação, que não quis ter o nome revelado.
Crime civil ou militar?
Segundo o jurista Sergio Bermudes se os militares estavam no Morro da Providência a serviço do Exército devem ser julgados pela justiça militar. A justiça comum é incompetente para julgar militares em serviço, de acordo com Bermudes. Se eles estivessem sem farda e sem a determinação do comando, o crime seria julgado pela justiça comum.
Prisão temporária
A Justiça decretou a prisão temporária dos militares por 10 dias no domingo (15).
Segundo os agentes da 4ª DP que investigam o caso, os mandados de prisão foram cumpridos na noite de domingo. Os suspeitos estão presos no 1º Batalhão de Polícia no Exército, na Tijuca, Zona Norte do Rio.
Os militares presos são um tenente, três sargentos e sete soldados. Segundo os agentes da delegacia, três suspeitos foram ouvidos pelo Exército no CML no domingo.
O Exército já tinha aberto um inquérito para apurar a morte dos três jovens. Os corpos foram encontrados na tarde de domingo em um lixão de Gramacho, em Duque de Caxias, Baixada Fluminense.
Ao ser procurado pelo G1, o CML informou que vai se pronunciar sobre as prisões ainda nesta segunda.
No sábado (14), o CML divulgou uma nota explicando o fato:
"Na manhã de hoje (sábado), tropas do Exército que realizam a segurança do pessoal, material e equipamentos empregados nas obras do Projeto Cimento Social, no morro da Providência, efetuaram a detenção de três elementos suspeitos, que teriam desacatado os militares de serviço, nas proximidades da Praça Américo Brum.
Em seguida, os elementos detidos foram encaminhados à presença do Comandante da tropa que, depois de ouvi-los, determinou que fossem liberados. Depois da liberação, as tropas do Exército não voltaram a ter contato com os elementos citados", diz a nota.
Protesto
Cerca de 200 moradores do Morro da Providência, na Zona Portuária do Rio, fizeram na tarde deste domingo uma passeata do Santo Cristo até o Comando Militar do Leste, no Centro do Rio, para protestar contra a morte de três jovens que moravam na comunidade. A manifestação aconteceu logo após encontrarem os corpos dos rapazes.
Segundo testemunhas, os manifestantes queriam conversar com algum responsável do Exército para tentar explicar as circunstâncias das mortes dos jovens. Ainda de acordo com testemunhas, os moradores não foram recebidos por ninguém.
Os moradores tentaram fechar a rua e tropas de choque do Exército tomaram posições. Testemunhas contaram que teria havido confronto com gás lacrimogênio.
;Irmã de vítima acusa o Exército
Débora Gonzaga Bastos, irmã de um dos três rapazes que sumiram no Morro da Providência e apareceram mortos no lixão de Gramacho, acusa soldados do Exército de terem prendido os jovens por quatro horas e, em seguida, de tê-los entregue a traficantes rivais de uma outra favela.
Segundo Débora, Wellington Gonzaga Bastos trabalhava na obra social da própria Providência, para ajudar na recuperação de casas, e estava voltando de um baile funk, em uma outra comunidade, quando foi abordado pelos soldados, às 7h30 da manhã de sábado (14). Débora conta que Wellington e os outros dois rapazes foram para o quartel e ficaram lá até às 11h30, quando os militares teriam deixado os jovens com criminosos do Morro da Mineira, no Centro da cidade.
Ela disse que o irmão vai ser enterrado nesta segunda, no cemitério São João Batista, em Botafogo, Zona Sul do Rio.