O juízo da 2ª Vara Federal Criminal de Salvador/BA condenou três acusados pelo crime de lavagem de dinheiro, tipificado no art. 1º da Lei n. 9.613/98. Os fatos ocorreram no curso do mandato de um dos réus, o ex-prefeito da cidade de Cansanção/BA, Ranulfo da Silva Gomes, de 2011 a 2015. As duas outras acusadas são a sua esposa Vilma Rosa de Oliveira, então secretária de Saúde do Município e atual prefeita da cidade, e a filha do casal, Pollyana Oliveira Gomes. A sentença, proferida pelo juiz federal Fábio Moreira Ramiro, titular da 2ª Vara, em 21 de agosto, impôs a Ranulfo Gomes a pena de 9 anos e 10 meses de reclusão, em regime fechado, e de 7 anos e 1 mês de reclusão às rés Vilma Oliveira e Pollyana Gomes.
O Ministério Público Federal ajuizou ação penal, na qual narrou na peça acusatória que os réus, "durante os anos de 2011 a 2014, ocultaram e dissimularam, dolosamente, a origem, a localização e a propriedade de bens e valores provenientes de crimes praticados por meio de organização criminosa contra a Administração Pública.” Esse esquema criminoso teria resultado no desvio de R$ 26.536.757,06 (vinte e seis milhões, quinhentos e trinta e seis mil, setecentos e cinquenta e sete reais e seis centavos).
Conforme consta na denúncia, os crimes antecedentes originaram a “Operação Making Of”, deflagrada no dia 10/11/2015, na qual foram instaurados quatro inquéritos policiais para investigar suspeitas de fraudes nos contratos firmados entre a Prefeitura de Cansanção/BA e as empresas M. Neves de Oliveira ME, G.S. Informática, Construtora e Terraplanagem Santos Andrade, Rubilene Dantas da Costa ME, Edvan Ferreira da Costa ME e Taveira Comercial de Combustíveis.
Consta nos autos que Ranulfo Gomes teria constituído a ORCRIM, voltada a desvios de recursos públicos, mediante o superfaturamento e contratações por aquele município. Além de ele ser o líder e responsável por atos de ocultação e dissimulação da origem ilícita das verbas públicas, era também o responsável pela contratação das empresas, atuando em conjunto com a sua esposa e secretária de Saúde do município de Cansanção/BA, Vilma Rosa de Oliveira Gomes, e sua filha Pollyana Oliveira Gomes, administradora da empresa Taveira Comercial de Combustíveis, ambas corrés na ação penal.
Não obstante o aumento dos valores creditados nas contas de Ranulfo Gomes, no período em que exerceu o cargo de prefeito municipal, o réu não teria declarado os mesmos valores junto ao fisco, tendo recebido, no período de 2011 a 2014, importâncias muito superiores aos de fato declarados à Receita Federal.
Ao analisar o caso, o juiz federal Fábio Ramiro, primeiramente, definiu o que se caracteriza lavagem de dinheiro: “é expressão que se refere a práticas econômico-financeiras que têm por finalidade dissimular ou esconder a origem ilícita de determinados ativos financeiros ou bens patrimoniais, de forma a que tais ativos aparentem ter uma origem lícita ou a que, pelo menos, a origem ilícita seja difícil de demonstrar ou provar”.
Com estas considerações iniciais, o magistrado destacou que a lavagem de dinheiro restou demonstrada nos autos, embora não tenham sido utilizadas práticas mais elaboradas, a fim de dificultar e confundir o rastreamento do dinheiro obtido de forma ilícita, uma vez que, para a dissimulação e ocultação do desvio do dinheiro público, utilizou-se contas bancárias de pessoas físicas e jurídicas, ligadas direta ou indiretamente ao próprio prefeito.
As investigações primárias que resultaram na deflagração da operação "Making Of" tiveram origem a partir da constatação de que, naquele município e de modo recorrente, as mesmas empresas estavam vencendo as licitações durante a gestão de Ranulfo Gomes. Revelou-se, posteriormente, no decorrer das investigações e a partir da instauração de novos inquéritos policiais, que as empresas recorrentemente vencedoras das licitações eram todas ligadas ao prefeito Ranulfo Gomes.
Foi ressaltado ainda que, durante investigação no município de Cansanção, no período de 16/08 a 08/10/2013, a Controladoria Geral da União na Bahia constatou a existência de diversas irregularidades nos contratos firmados entre as empresas citadas e o município, vez que existia ausência de competitividade, especialmente quanto à forma de como ocorria a publicação dos editais, bem como a gestão municipal violava também o princípio da publicidade dos atos administrativos - no caso - das licitações, não garantindo o acesso dos certames ao público em geral, restringindo o acesso a outras empresas eventualmente interessadas.
As provas dos autos revelaram que, com o propósito de ocultar e dissimular a origem dos recursos obtidos de forma ilícita com a prática dos crimes antecedentes mencionados, os réus realizaram diversas operações financeiras entre as empresas integrantes do Grupo Gomes, como também com as empresas controladas direta ou indiretamente por Ranulfo Gomes e familiares, demonstrando, de forma explícita, que a máquina pública era utilizada para o enriquecimento ilícito do réu, de seus familiares, de suas empresas, como também de empresários correligionários do acusado.
No tocante ao crime, o juiz federal Fábio Ramiro declarou em sua sentença: “Não há dúvida de que as recorrentes operações financeiras entre as empresas do Grupo Gomes, e entre essas empresas e as outras controladas por ele, constituem uma forma de camuflagem para a lavagem de dinheiro, um modo de dificultar o rastreamento da verdadeira origem dos recursos financeiros obtidos de maneira ilegal”.
Ao final, o juiz federal condenou o réu e as rés e dosou a pena aplicada a cada um/uma às seguintes sanções: Ranulfo da Silva Gomes, condenado em 9 anos, 10 meses e 3 dias de reclusão e 246 dias-multa; e as rés Vilma Rosa de Oliveira Gomes e Pollyanna Oliveira Gomes, condenadas definitivamente em 7 anos, 1 mês e 15 dias de reclusão e 146 dias-multa, sendo que cada dia-multa corresponde à situação econômica do(as) acusado(as), em observância ao art. 60 do CP.
A sentença condenatória foi proferida nos autos da Ação Penal 0027149-67.2018.4.01.3300.