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19/01/2023 -

Decisão da Subseção Judiciária de Rio Verde em HC coletivo

Decisão da Subseção Judiciária de Rio Verde em HC coletivo

19/01/23 18:08

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Trata-se de Habeas Corpus Coletivo impetrado por ALEXANDRE APRIGIO DO PRADO em face do DIRETOR GERAL DA POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL e do DIRETOR GERAL DA POLÍCIA FEDERAL tendo por objeto a concessão de salvo conduto em favor dos manifestantes mobilizados às margens da rodovia BR-060, trecho do trevo do município de Rio Verde/GO. Em suma, requer que seja atribuído o direito de reunião às margens da rodovia BR-060, sem que haja a interdição completa da via.

Relatado o essencial. Decido.

Em percuciente parecer juntado aos presentes autos, o Ministério Público Federal destacou a absoluta ilegitimidade do impetrante para impetração de habeas corpus coletivo. Com efeito, conforme restou decidido no Habeas Corpus Coletivo n. 143.641, a impetração segue a lógica do mandado de injunção coletivo, motivo pelo qual os legitimados se encontram no art. 12 da Lei 13.300/2016. Firme nessa premissa, o HC coletivo deve ser promovido:

I - pelo Ministério Público, quando a tutela requerida for especialmente relevante para a defesa da ordem jurídica, do regime democrático ou dos interesses sociais ou individuais indisponíveis;

II - por partido político com representação no Congresso Nacional, para assegurar o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas de seus integrantes ou relacionados com a finalidade partidária;

III - por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos 1 (um) ano, para assegurar o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas em favor da totalidade ou de parte de seus membros ou associados, na forma de seus estatutos e desde que pertinentes a suas finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial;

IV - pela Defensoria Pública, quando a tutela requerida for especialmente relevante para a promoção dos direitos humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal .

Obviamente, o impetrante não se alinha a qualquer das alíneas acima, de modo que é caso de indeferimento de plano por ilegitimidade.

Cabe pontuar que a análise do mérito como Habeas Corpus individual também não assiste razão ao impetrante. Isso porque, ao requerer o direito de reunião mediante interdição não completa da via, resta implícito que pretende fazer valer o direito que acredita ter mediante interdição parcial da rodovia.

De início, vale destacar que a interdição de via pública – ainda que parcial – representa a prática de ao menos duas infrações de trânsito previstas no CTB:

Art. 253-A. Usar qualquer veículo para, deliberadamente, interromper, restringir ou perturbar a circulação na via sem autorização do órgão ou entidade de trânsito com circunscrição sobre ela:

Infração - gravíssima;
Penalidade - multa (vinte vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses;
Medida administrativa - remoção do veículo.

§ 1º Aplica-se a multa agravada em 60 (sessenta) vezes aos organizadores da conduta prevista no caput.

§ 2º Aplica-se em dobro a multa em caso de reincidência no período de 12 (doze) meses.

§ 3º As penalidades são aplicáveis a pessoas físicas ou jurídicas que incorram na infração, devendo a autoridade com circunscrição sobre a via restabelecer de imediato, se possível, as condições de normalidade para a circulação na via.

Art. 254. É proibido ao pedestre: (...)

IV - utilizar-se da via em agrupamentos capazes de perturbar o trânsito, ou para a prática de qualquer folguedo, esporte, desfiles e similares, salvo em casos especiais e com a devida licença da autoridade competente

A par das implicações de cunho administrativo, impõe-se compreender que a interdição parcial de via pode, em tese, configurar os crimes previstos no art. 262 e art. 265, ambos do Código Penal:

Art. 262 - Expor a perigo outro meio de transporte público, impedir-lhe ou dificultar-lhe o funcionamento:

Pena - detenção, de um a dois anos.

§ 1º - Se do fato resulta desastre, a pena é de reclusão, de dois a cinco anos.

§ 2º - No caso de culpa, se ocorre desastre:

Pena - detenção, de três meses a um ano.

Art. 265 - Atentar contra a segurança ou o funcionamento de serviço de água, luz, força ou calor, ou qualquer outro de utilidade pública:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.

Parágrafo único - Aumentar-se-á a pena de 1/3 (um terço) até a metade, se o dano ocorrer em virtude de subtração de material essencial ao funcionamento dos serviços. (Incluído pela Lei nº 5.346, de 3.11.1967)

Esse o quadro, o bloqueio parcial de rodovia, além de causar enorme transtorno à população, é capaz de inviabilizar ou dificultar o funcionamento de serviços públicos de segurança pública, saúde, e outros de relevante utilidade pública, o que pode afetar a realização de cirurgias de emergência, transplantes, atendimento médico, desabastecimento de alimentos e itens essenciais, assim como prevenção e repressão de crimes. De igual modo, o serviço público de transporte resta obstado do desempenho minimamente razoável de suas tarefas ordinárias.

Cumpre esclarecer que a Rodovia BR-060 foi duplicada na região de Rio Verde/GO justamente por causa do reconhecimento de elevado tráfego de caminhões e carros. Trata-se de fato notório que acidentes pontuais neste trecho da rodovia são capazes de causar enormes filas de veículos, impactando negativamente a rotina de todos, especialmente trabalhadores, pessoas doentes, crianças e idosos. Nessa perspectiva, tenho como evidente que os transtornos causados pelo direito de reunião invocada pelo impetrante suplantarão, em muito, a tutela do direito constitucional que alega ter.

Por fim, ainda vige a ordem concedida pelo Supremo Tribunal Federal no bojo da ADPF 519, a fim de que a Polícia Rodoviária Federal e a Polícia Militar promovam a imediata desobstrução de todas as vias públicas, com garantia de total trafegabilidade.

Em suma, este juízo não indefere o exercício de direito de reunião, protesto e livre manifestação de pensamento. Todavia, a forma como requerida é manifestamente ilegal e, por isso, não pode ser chancelada pelo Poder Judiciário e, acaso ocorra, será repreendida com os rigores da lei, na forma estabelecida pelo Estado Democrático de Direito.

Ante o exposto, denego a concessão da ordem de habeas corpus.


Rio Verde, 11 de novembro de 2022.


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