14/09/16 15:46
O juiz federal da 17ª Vara Antonio Oswaldo Scarpa proferiu sentença em ação penal movida pelo MPF contra seis cidadãos sírios presos no aeroporto internacional de Salvador portando passaportes falsos ao tentarem embarcar para Madrid.
O magistrado absolveu os acusados considerando excluída a sua culpabilidade por não ser razoável exigir deles atuação diversa em razão da situação de guerra civil existente na Síria, julgando tratar-se de hipótese de inexigibilidade de conduta diversa, causa supralegal de exclusão de culpabilidade.
Os denunciados deixaram a Síria com destino ao Brasil utilizando-se dos seus passaportes verdadeiros e fugindo da guerra que assola o seu país em busca de melhores condições de vida. Já no Brasil, foram advertidos por conterrâneos de que o país não oferecia condições para se estabelecerem e que era melhor seguirem para a Europa, onde encontrariam ajuda humanitária e condições mais favoráveis.
A DPU pugnou pelo reconhecimento da causa excludente da culpabilidade, consistente na inexigibilidade de conduta diversa em vista da situação de guerra na Síria.
Segundo a sentença, “para reconhecimento da referida excludente, é necessária a prova incontestável da situação de dificuldade enfrentada, decorrente de fatores exteriores à vontade do acusado e de situações que teriam fugido ao seu controle, de modo que a utilização de documento falso para a obtenção de passaporte se caracterize como medida extrema, adotada apenas em último caso. Verifica-se a plausibilidade de tese defensiva, devendo ser reconhecida e existência da excludente de culpabilidade em razão de inexigibilidade de conduta diversa”.
E continua o julgador: “Observa-se que os acusados, diante da notória situação de guerra civil em que se encontra o seu país de origem, fato que prescinde de comprovação, buscaram os meios necessários para prover a sobrevivência e a subsistência própria e de suas famílias, iniciando um plano de fuga de seu país natal. Os relatos da situação particular de cada um dos denunciados de que vivenciaram a morte de conhecidos e familiares, perderam seus empregos e meios de subsistência e se viam cada vez mais ameaçados pelo conflito, revela o drama por que passaram e passam para fugir da periclitante situação de guerra civil”.
O magistrado registra dados recentemente divulgados do conflito, que já dura cinco anos e vitimou mais de 470 mil pessoas, afirmando serem alarmantes e que corroboram as declarações dos denunciados e justificam a preocupação da comunidade internacional com os refugiados sendo que mais de 85% da população daquele país se encontra em estado de pobreza, 53% está desempregada, 45% das crianças não frequentam a escola, 58% dos hospitais públicos encontram-se fechados ou funcionando parcialmente e a expectativa de vida da população caiu de 70 para 55 anos.
Conforme foi evidenciado pela defesa e pontuado pelo juiz federal Antonio Oswaldo Scarpa na sua sentença, as dificuldades enfrentadas pelos denunciados no Brasil, como o preconceito, as diferenças culturais e as dificuldades econômicas, serviram para estender o seu sofrimento já vivenciado em seu país natal em razão da guerra, que, aliado à angústia da separação de seus familiares, culminou com a obtenção dos passaportes falsos a fim de buscarem melhores condições de vida.
“Ainda que os denunciados tenham se utilizado do falsum quando já estavam em território brasileiro, afastados de potenciais situações de perigo de vida, verifica-se que as condutas praticadas por eles atenderam ao plano de fuga mencionado, visando, porém, à reconstituição de suas vidas e de suas famílias”, finalizou o juiz.
O Ministério Público Federal não recorreu da sentença absolutória.