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21/11/2023 - INSTITUCIONAL

Consciência Negra: confira entrevista especial com Florentina Souza, professora de Literatura Brasileira da UFBA

Consciência Negra: confira entrevista especial com Florentina Souza, professora de Literatura Brasileira da UFBA

Como parte das celebrações e reflexões promovidas pelo Dia Nacional da Consciência Negra, o JFH traz mais uma entrevista especial, em parceria com a Comissão de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral, do Assédio Sexual e da Discriminação no âmbito da Seção Judiciária da Bahia (CPEAMASD/SJBA).

 Desta vez, a entrevistada é a professora Titular de Literatura Brasileira da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Florentina da Silva Souza. 
 
Florentina Souza possui graduação em Letras Vernáculas com estrangeira Licenciatura pela Universidade Federal da Bahia (1978), graduação em Letras Vernáculas Bacharelado pela Universidade Federal da Bahia (1979), mestrado em Letras pela Universidade Federal da Paraíba (1985). Ela concluiu o doutorado em Estudos Literários pela Universidade Federal de Minas Gerais (2000). Atualmente, é professora da UFBA e atua no Programa de Pós- Graduação em Letras e Linguística e no Programa de Pós- Graduação em Estudos Étnicos e Africanos (CEAO-UFBA). Coordena o projeto EtniCidades: escritoras/es e intelectuais afro-latinos, coordenou de junho de 2005 a janeiro de 2008 o Projeto de Ações Afirmativas Conexões de Saberes: diálogos entre a universidade e as comunidades populares (UFBA/MEC/SECAD). Publicou, em 2005, o livro Afrodescendência em Cadernos Negros e Jornal do MNU, foi vice-coordenadora do Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO/UFBA) e edita, juntamente Jocélio Teles, a revista Afro-Ásia. É segunda vice-presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros. 
 
1) Na sua opinião, o que a data 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, representa para a comunidade afro-brasileira?  
 
O dia 20 de novembro, como toda data comemorativa, é sim um momento especial. Especial para refletirmos sobre a atuação das pessoas negras na constituição da riqueza e da cultura do Brasil. Assim, a data se configura como marco para toda comunidade brasileira. É uma oportunidade para revisitar a história e enfatizar a capacidade de nossos ancestrais para reconstruir suas existências diante da barbárie violenta da escravidão e do racismo. É uma data importante para reflexão, porém esta reflexão deve estar na agenda do dia a dia, vez que a comunidade afro-brasileira defronta-se cotidianamente com forças estruturais do racismo e outras discriminações.  
 
2) Qual a importância do conhecimento da história do Brasil e do debate permanente, não só neste mês de novembro, para o entendimento da relevância da data e das discussões sobre as desigualdades no país? 
 
O conhecimento da história é fundamental para a existência de grupos, comunidades e nações. O Brasil, em geral, focaliza a história de grupos que se tornaram hegemônicos, enfatizando principalmente ações e memórias de pessoas não negras. Vale a pena repetir que o Brasil foi construído por mãos, corpos e mentes negras, não há possibilidade de esquecer ou omitir este fato. Um dos terríveis episódios da história deste país foi a escravização e suas consequências nefastas. A chamada “abolição” não trouxe, de fato, liberdade para as pessoas negras; sem terras, sem emprego elas foram vítimas de toda sorte de discriminação, foram e até hoje são alvos do racismo, responsável pelas chocantes desigualdades no país. O conhecimento da história passada e análise de situações do presente no campo da educação, saúde, direitos humanos, saneamento, entre outros, poderão contribuir para combater as várias formas de racismo perpetradas contra as pessoas negras no país.  Acredito que não é possível analisar a sociedade brasileira se não tomar como ponto de partida a discussão sobre formas de combate ao racismo. Com isto, não ignoro a existência de outros tipos de discriminação como gênero e sexualidade, por exemplo. Entretanto, pesquisas empreendidas por institutos fundações diferentes têm demonstrado que os indicadores sociais da população negra são os piores possíveis. A que atribuir tal cenário se não ao racismo? 
 
3) Como professora da Universidade Federal da Bahia, na sua opinião, como a educação pode atuar para enfrentar o racismo estrutural? 
 
A escola tem um papel fundamental na formação de crianças e jovens, é na escola que são ampliados e/ou retificados atos e comportamentos desenvolvidos na família. Se voltada para uma educação plural, a escola promoverá uma educação antirracista que não se baseie em conhecimentos, história e memória únicos que combata discriminações de toda ordem.  
 
Hoje temos uma legislação que empenhada no ensino da história, cultura e produção de pessoas negras e indígenas para a formação do país, entretanto, estas leis não têm sido devidamente implementadas pelas escolas. 
 
O conhecimento da história e as discussões sobre democracia, racismo, sexismo e equidade constituem importantes caminhos para a formação cidadã.  Uma educação antirracista deverá apontar as causas das desigualdades; analisar criticamente os mecanismos da colonialidade que desenharam e desenham modelos de relações étnico-raciais no país. Tem assim um papel fundamental para que consigamos viver em uma sociedade onde todas as pessoas combatam as discriminações e opressões.  
 
4) Vive-se em uma sociedade que não assume o racismo e, mesmo assim, sabe-se que ele existe. Como a família pode trabalhar essas questões para que as crianças e jovens cresçam sem esse tipo de preconceito?  
 
A família é uma das primeiras, senão a primeira instituição com que as crianças têm contato. É através da família que elas têm contato com os princípios básicos de sociabilidade, respeito ao outro, equidade, por exemplo. Cabe à família demonstrar com atos e palavras que todas as pessoas possuem direitos e deveres, que todas as pessoas precisam ser respeitadas, que o racismo, o sexismo e todos os tipos de discriminação precisam ser combatidas. Ou seja, a família tem por obrigação ensinar princípios democráticos e antirracistas. 
 
5) Podemos dizer que há o que se comemorar no dia 20 de novembro? Ou ainda há mais a fazer e a refletir?  
 
Não sou otimista a este ponto. Acredito que devido a ações dos movimentos negros e de outros movimentos sociais, algumas mudanças ainda pequenas podem ser observadas no combate ao racismo na sociedade brasileira. Há muito que fazer para alterar a desigualdade sistêmica no país, expressa através do continuado genocídio e aprisionamento de jovens negros, da violência contra mulheres, da ausência de educação pública de qualidade, de falta de atendimento digno no sistema de saúde pública, enfim são tantas as faltas e carências que mesmo depois de séculos de lutas, de insurgência e de mortes as comunidades negras continuam enfrentando cotidianamente o racismo. 
 

Essa matéria está associada ao ODS 10 (Redução das Desigualdades) e 16 (Paz, Justiça e Instituições Eficazes). 


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