O juiz federal substituto Flávio Marcondes Soares Rodrigues, no exercício da titularidade da 2ª Vara Federal de Feira de Santana, acolheu pedido da Procuradoria da União na Bahia, e determinou que o município de São Gonçalo dos Campos, através do seu prefeito Antônio Dessa Cardozo, se abstenha de realizar o protesto ao qual organizou, ou qualquer outro evento previsto para o dia 28/8, que implique o bloqueio da BR-101 ou de qualquer rodovia federal, sob pena de multa de R$ 200 mil, no caso de descumprimento da decisão.
Alegou a União que o Município acionado planeja fechar a Rodovia BR-101 no dia 28/8. A ameaça de interdição teria como causa a disputa entre os municípios de São Gonçalo dos Campos e Feira de Santana, decorrente da instalação de Centro de Distribuição de empresa em área cuja titularidade é reclamada por ambos os municípios.
Verificou o magistrado indícios veementes que apontam para organização de manifestação encabeçada pelo Município réu, através do prefeito Antônio Dessa Cardozo, para interromper o tráfego na BR-101, no dia 28/8, a partir das 8h.
Na decisão liminar, o magistrado destacou que a análise do pedido merece o necessário enfrentamento acerca dos limites do exercício da liberdade de manifestação e reunião, consectários do direito fundamental de liberdade estatuído nos incisos IV, XV e XVI do art. 5º da Constituição Federal.
A decisão ressalta que os direitos de reunião e manifestação pacífica são expressão maior do núcleo de direitos tutelados pelo Estado Democrático de Direito. Revelam aquela porção de liberdade na qual o cidadão tem a faculdade de exteriorizar seu pensamento com seus pares, com vistas a persuadir os demais ou as instituições governamentais, ou simplesmente, firmar seu ponto de vista acerca de algo que entenda relevante. Entretanto, para que esse exercício se revista de toda essa proteção constitucional, é imprescindível que não fira direitos fundamentais de terceiros, sob pena de esse exercício do direito se transformar em exercício do arbítrio. O caso concreto, segundo o juiz, é que define se o eventual ato se reveste de direito ou arbítrio.
Observou o julgador que, por mais nobre intenção política que tenha levado o prefeito a incitar a população ao iminente bloqueio da BR-101, tal ato não encontra nenhum amparo jurídico, porquanto malfere legítimo direito fundamental de circulação de terceiros que, para além de se tornarem vitimados com o prejuízo da paralisação da rodovia, não se encontram nas mesas de debates da solução efetiva da querela territorial noticiada.
Ressaltou o juiz que a decisão não pretende inibir o direito constitucional dos cidadãos de se reunirem pacificamente e manifestar seu pensamento num cenário coletivo. Isso está fora do núcleo decisório. O que se pretende inibir é a ameaça latente de bloqueio da BR-101, bem da União (art. 20, I, da Constituição Federal), de uso comum do povo.
Não será com o bloqueio da rodovia e queima de pneus, entendeu o magistrado, que a municipalidade insurgente irá conseguir efetivamente firmar suas bases territoriais. Apontou que os exemplos colhidos diariamente nos noticiários acerca das depredações nos grandes centros urbanos não servem de exemplo para simbolizar conquistas. As conquistas sociais, através da ação direta do povo, devem ser obtidas com manifestações pacíficas, manifestações essas que não causem o desassossego dos demais cidadãos e que não tragam prejuízos para os demais nem para o patrimônio público.
Finalizou argumentando que a ninguém serve o bloqueio de uma Rodovia da importância da BR-101, segunda rodovia em volume de veículos no Estado da Bahia, onde flui o tráfego diário de milhões de reais em mercadorias, onde milhares de passageiros viajam em ônibus intermunicipais e interestaduais, sem contar os milhares de cidadãos que cruzam o território baiano em veículos particulares.
Acaso descumprida a decisão, além da multa, o juiz autorizou a utilização da força policial, nos limites estritamente necessários para a desobstrução do leito da rodovia.