Uma decisão recente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) reafirmou a garantia da independência funcional dos magistrados brasileiros. Em sessão realizada no mês de agosto, o Conselho julgou improcedente o Processo Administrativo Disciplinar (PAD) instaurado em desfavor do juiz federal e associado da Ajufe João Bosco Costa Soares da Silva, por supostas condutas incompatíveis com a Lei Orgânica da Magistratura (Loman).
De acordo com os autos, a investigação contra João Bosco teve início após imputações de morosidade na condução de processos, tumulto processual, falta de urbanidade com as partes e participação em solenidades de conotação política. Entretanto, as acusações genéricas e infundadas não foram aceitas pela maioria esmagadora dos conselheiros do CNJ.
A Ajufe integrou o procedimento na condição de amicus curiae. A relatora do caso, conselheira Ana Maria Amarantes, começou o voto, pela absolvição, pontuando que, ao se debruçar cuidadosamente sobre o PAD, lembrou-se de uma reflexão bem conhecida, de autoria do jurista uruguaio Eduardo Couture, ou seja: “Da dignidade do juiz depende a dignidade do direito. O direito valerá, em um país e em um momento histórico determinados, o que valham os juízes como homens. No dia em que os juízes tiverem medo, nenhum cidadão poderá dormir tranquilo.” Lembrou, ainda, a ilustre Relatora, a existência de um cenário de clara animosidade entre os Representantes, membros do Ministério Público Federal e Estadual e o magistrado, em decorrência da não-homologação, pelo referido magistrado, de um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta), no valor de seis milhões de reais.
Durante o julgamento, o presidente da Ajufe, Antônio César Bochenek, fez uso da palavra e destacou a independência judicial garantida pela Constituição aos magistrados.
Nesse sentido, a conselheira relatora, Ana Maria Amarante, assinalou, em seu voto, que, em face da independência funcional, pode o magistrado decidir segundo sua interpretação do sistema jurídico, livre de pressões externas e ingerências, discordando das partes e até mesmo do Ministério Público, sem que seja por isso punido disciplinarmente. Para a hipótese de insurgência contra atos judiciais, dispõe as partes dos meios de impugnação adequados às peculiaridades de cada situação. E mais, pontuou a relatora: “O que se revela teratológico, porém, é que somente a partir da animosidade surgida entre o juiz e o Ministério Público é que surgiu a representação contra o magistrado com o consequente pedido de sua aposentação.”
Demais disso, Amarante ressaltou que as representações disciplinares contra o juiz demonstram uma “falta de assimilação a todas as mudanças advindas com os processos coletivos” e, ainda, lembrou que, de uma quantidade enorme de processos esquadrinhados pelos subscritores das representações, foram “pinçadas” apenas cinco ações: uma do ano de 2005, uma de 2007, uma de 2008, outra de 2009 e a última de 2011, todas envolvendo interesses coletivos.
Amarante pontuou que o magistrado Soares “comporta-se dentro das novas transformações do Direito e em harmonia com a futura norma processual, preocupando-se com as questões sociais e agindo de forma adequada para a solução do conflito.” E acresceu: “o que Ministério Público entende como simples tumulto processual e amplificação indevida das lides deve ser compreendido mais como uma habilidade do magistrado em dar efetividade às decisões judiciais, no sentido de solucionar os problemas sociais.”
Em conclusão, sentenciou a Relatora: “o investigado, se preocupava no âmbito dessas decisões coletivas em efetivar o que nós fazemos aqui no Conselho Nacional de Justiça”, pois, segundo asseriu, “não basta falar com o Juiz, não basta aplicar o direito, o qual tem que ser efetivo e produtivo”, pontuando que segundo relatórios das Correições Ordinárias Gerais da Corregedoria do TRF, o rendimento de Soares é “notável”.
Ouvido por esta Assessoria de Imprensa da Ajufe o referido magistrado lembrou-se do Procedimento de Investigação Criminal sob nº 1.00.000.004620/2012-12, que investigou conduta da Procuradora da República Damaris Rossi Baggio de Alencar, no qual, dentre inúmeras irregularidades, o ilustre PRR Jacobina, quanto ao desvirtuamento de TAC não-homologado, asseverou “que a representada assumiu o risco de criar um sistema absolutamente próprio de compras e repasses que a lei não prevê nem o TAC respalda, baseada na transferência de recursos volumosos a contas privadas de servidores públicos, e controlado por ela mesma”. De lembrar que o CNMP sequer investigou esse caso.
Aludiu, ainda, o referido magistrado, conhecida frase do ex-presidente norte-americano, Abraham Lincoln: “Pode-se enganar a todos por algum tempo; pode-se enganar alguns por todo o tempo; mas não se pode enganar a todos todo o tempo.”
Por fim, disse que é essencial para a nossa tão aviltada República que se retire membros do Ministério Público do “berço esplêndido” da total irresponsabilidade jurídica, inserindo-os no sistema de freios e contrapesos. Fez questão, por fim, de expressar admiração pelo presidente da Ajufe, Antônio César Bochenek.
Fonte: AJUFE - Associação dos Juízes Federais do Brasil.