Se a vida anda difícil para quem tem "só" curso superior, o que dizer de quem nem isso tem?
Ana Cristina Rosa
Alguém indagou o motivo da associação que fiz semana passada entre o nível acadêmico e a qualificação de negras e negros quando o próprio presidente da República é "exemplo de político qualificado, mas sem nível universitário". Embora acredite que há destinatário melhor para essa pergunta, me arrisco a responder.
Compreendo perfeitamente que não há relação direta entre o saber universitário e a habilidade de fazer política. E sei que diploma não é um certificado de qualidade. Além do mais, para ocupar cargo de ministro de Estado basta ser brasileiro, maior de 21 anos e estar no exercício dos direitos políticos, diz a Constituição.
Integrantes do Movimento Negro fazem protesto na Câmara dos Deputados - Pedro Ladeira - 26.set.23/Folhapress
Mas considero muita ingenuidade crer que um governante entregaria o comando de um ministério ou grande autarquia para alguém sem instrução superior. Por mais experiente e habilidosa que seja a pessoa.
Se a vida anda difícil para quem tem "só" curso superior, o que dizer de quem nem isso tem?
Nesse cenário, ser negro ou mulher são agravantes. "Mulheres e negros não construíram espaços de poder político e econômico nas últimas décadas (...) pois historicamente esses grupos minorizados foram impedidos de acessar os mecanismos de ascensão social", resumiu o professor de Sociologia Tadeu Kaçula, ao comentar meu artigo "Problema Crônico".
Não se trata de colocar todo político no mesmo balaio. Existe distância entre a esquerda e a extrema direita. Mas elas se aproximam quando partidos políticos de diferentes espectros se unem para reduzir recursos públicos destinados a candidaturas negras, por exemplo.
Não dá para esperar aceno civilizatório de quem defende o racismo, a misoginia, a transfobia, o ódio, a ignorância, a mentira, entre outros males. Mas ainda é possível ficar chocado e frustrado quando quem se diz defensor da pauta humanitária e da justiça social desfere golpes contra princípios fundamentais para uma sociedade que se pretende justa e igualitária. Não importa a intenção.
Fonte: Folha de São Paulo
por Iris Helena Gonçalves de Oliveira
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Justiça Federal - Seção Judiciária de Goiás