Ministro sinaliza que deve derrubar o artigo 19 do Marco Civil da Internet, em discussão no STF
Por
Flávia Maia
, Valor — Brasília
Política
No terceiro dia de julgamento sobre a responsabilidade das plataformas digitais sobre as publicações de terceiros no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Dias Toffoli sinalizou que deve derrubar o artigo 19 do Marco Civil da Internet (MCI), que está em discussão na Corte. Ainda sem concluir o voto, o ministro disse que é “evidente” que o regime atual é “inconstitucional”. O julgamento será retomado nesta quinta-feira (5) com a continuação da leitura do voto. Até o momento, ele já leu 94 páginas.
O ministro também já consignou que a eliminação do artigo 19 do MCI do ordenamento jurídico não cria vácuo de responsabilidade civil às plataformas de internet quanto ao conteúdo gerado por terceiros. Portanto, elas terão que indenizar abusos cometidos em publicações de terceiros. Para ele, na ausência do artigo 19, as plataformas devem seguir o artigo 21 da mesma lei, mas estendendo sua aplicação, para todos os direitos fundamentais e direitos à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem. O artigo 21 estabelece que as empresas serão responsabilizadas quando forem notificadas e não suspenderem publicações que violem a intimidade por postagens de imagens com cenas de nudez ou atos sexuais.
Toffoli defendeu que o artigo 19 assegura “imunidade” às plataformas “a pretexto de assegurar as liberdades de expressão e de informação e à inovação tecnológica”, pois “a responsabilidade [para as empresas] é o contrário de todas as outras e só surge depois do descumprimento”.
Na avaliação do relator, desde a sua edição, o artigo 19 do Marco Civil mostrou-se “incapaz de oferecer proteção efetiva aos direitos fundamentais e resguardar os princípios e valores constitucionais fundamentais nos ambientes virtuais”. Para ele, o dispositivo não está “apto a fazer frente aos riscos sistêmicos que surgiram nesses ambientes, a partir do desenvolvimento de novos modelos de negócios e de seu impacto nas relações econômicas, sociais e culturais”.
Após o advogado-geral da União (AGU), Jorge Messias, defender na tribuna do STF a inconstitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet na semana passada, a União divulgou posição esclarecendo que a invalidade do dispositivo não é total. A fala de Messias em sustentação oral foi uma surpresa porque foi contrária aos documentos apresentados no processo até então, em que a União defendia que o artigo continuasse válido, mas com uma série de ponderações.
No novo documento, a União se reaproxima de sua primeira posição e tenta conciliar com a fala de Messias na tribuna, no sentido de que a lei é válida em parte e inconstitucional em outros trechos, por isso, precisa ter um rol de excepcionalidades. Para a AGU, o artigo 19 continua válido quanto à responsabilidade das plataformas digitais em caso de matérias jornalísticas, conteúdos sobre a honra de agentes e personalidades públicas, e calúnias e difamações. Assim, as plataformas só serão responsabilizadas se não retirarem esses conteúdos após uma ordem judicial.
A AGU traz um rol de assuntos que devem ser derrubados pelas plataformas de forma imediata sem necessidade de nenhum tipo de notificação, judicial ou não. Ou seja, em sentido diferente da atual interpretação do artigo 19. Deverão ser retirados de forma imediata, por exemplo, conteúdos inverídicos contra a democracia e sistema eleitoral, e publicações que induzam suicídio, crime contra crianças, preconceitos por raça, etnia e religião.
Fonte: Valor Econômico 05/12/2024
Iris Helena
Biblioteca