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16/05/2006 16:48 -

Revogada liminar sobre Belo Monte

Revogada liminar sobre Belo Monte

O juiz federal da Subseção de Altamira, Herculano Martins Nacif, revogou nesta terça-feira, 16, liminar que impedia temporariamente a realização de estudos, audiências públicas e outros procedimentos preliminares necessários para a construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, sudoeste do Pará. O magistrado atendeu a pedidos de reconsideração formulados pelo Ibama e pela Eletronorte.(Veja a decisão na íntegra)

Os procedimentos preliminares estavam suspensos desde o final de março passado, quando o juiz Antônio Carlos Campelo, que então respondia pela Subseção de Altamira, durante as férias regulares de Nacif, concedeu liminar ao apreciar ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal. Posteriormente, a liminar de Campelo foi confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em decisão do juiz federal Ávio Mozar José Ferraz de Novaes, convocado para atuar junto ao TRF.

Com a revogação da liminar, o Ibama e a Eletronorte poderão realizar estudos, consultas públicas, audiências públicas, "enfim, tudo que seja necessário a possibilitar a conclusão final da autarquia ambiental (Ibama) quanto ao licenciamento, ou não, da obra, ficando assegurado o pleno exercício do seu poder de Polícia", devendo ser observado rigorosamente, todavia, o Decreto Legislativo nº 788/2005, votado pelo Congresso Nacional e que autorizou os procedimentos que antecedem a construção de Belo Monte.

A revogação da liminar está fundamentada em 37 laudas. O juiz ressalta que a liminar concedida por Antônio Carlos Campelo "está fundamentada na apreciação da longa e densa exposição de motivos trazida pelo Ministério Público Federal e foi prolatada de forma firmemente célere, revelando-se, naquele momento processual, oportuna, vez que se trata de questão ambiental relevante."

Complementa Nacif: "Aliás, é bem possível que, naquele momento, premido pela urgência da situação e dispondo apenas da aterrorizante visão do autor da ação, exposta numa bem articulada peça de ingresso, talvez eu também teria concedido a medida acauteladora, sem prejuízo, entretanto, da posterior e mais refletida análise da quaestio, desta feita já com o contraponto argumentativo da parte contrária."

O magistrado observa, entretanto, que a juntada, aos autos do processo, de farta argumentação já encaminhada ao TRF-1ª Região, e com base em pedidos de reconsideração da Eletronorte e do Ibama, foi possível ao juízo formar outro entendimento sobre a demanda. Nacif destacou que a demora na conclusão sobre a viabilidade do projeto de construção de Belo Monte "apenas trará prejuízos estratégicos e financeiros ao País e aos milhões de consumidores, que certamente terão que arcar com os elevados custos das soluções provisórias que, deveras, são, em sua maioria, bem mais poluentes que a energia renovável obtida através de uma usina hidrelétrica."

Belo Monte, diz o juiz de Altamira, "não será a panacéia para todos os males". Mas ele destaca a necessidade de admitir-se que "o empreendimento reveste-se da mais alta importância, no que tange à planta energética nacional. Isso, é claro, se constatada a viabilidade técnica/econômica/ambiental do projeto", nos moldes do que é previsto no decreto legislativo votado pelo Congresso Nacional.

O magistrado não vê inconsticionalidade no decreto. Ele observa que a matéria teve aprovação maciça por parte dos presentes nas sessões de votação. "Isto, por si só, já traz consigo uma notória dificuldade para se promover censura a tal diploma. Em verdade, são os senadores e deputados federais que, no âmbito da Federação/Nação, representam a vontade popular e os interesses dos Estados-membros. É neles e no seu entendimento ideológico que as populações depositam seus votos de confiança. São eles os mais legítimos representantes do sentimento geral das pessoas que representam", afirma o magistrado.

Destaca o juiz que "nem mesmo a oposição, em um único momento, entendeu por bem tecer qualquer crítica quando ao mérito da instalação futura da hidrelétrica, considerando, a maioria, segundo as notas taquigráficas juntadas pelo Ministério Público Federal, que existe, em realidade, um atraso em relação à implementação do empreendimento".

Nacif entende que para os trabalhos atualmente desenvolvidos pelo Ibama e pela Eletrobras - estudos e coleta de informações junto às comunidades do entorno -, não se faz necessária qualquer autorização legislativa, vez que dispositivo do próprio decreto prevê que tal autorização é necessária apenas quando do início dos trabalhos relativos à construção do aproveitamento hidrelétrico de Belo Monte. Resume o magistrado que o decreto legislativo questionado pelo Ministério Público Federal tem por objetivo "autorizar a implantação do projeto, o que somente será permitido se forem obedecidas as condicionantes impostas (pelo decreto)."

Veja os principais trechos da decisão que revogou a liminar

Liminar de Campelo - "Cumpre-me registrar que a r. decisão de fls. 87/92, de lavra do eminente magistrado federal que respondeu por esta Subseção Judiciária durante o meu afastamento por motivo de férias, está fundamentada na apreciação da longa e densa exposição de motivos trazida pelo MPF e foi prolatada de forma firmemente célere, revelando-se, naquele momento processual, oportuna, vez que trata-se, como aqui já ressaltado, de questão ambiental relevante.

"Aliás, é bem possível que, naquele momento, premido pela urgência da situação e dispondo apenas da aterrorizante visão do autor da ação, exposta numa bem articulada peça de ingresso, talvez eu também teria concedido a medida acauteladora, sem prejuízo, entretanto, da posterior e mais refletida análise da "quaestio", desta feita já com o contraponto argumentativo da parte contrária.

"Assim é que, dado o atual amadurecimento temporal da demanda, com, inclusive, a juntada de farta argumentação já encaminhada para apreciação do Colendo TRF da 1ª Região, em sede de Agravos de Instrumento, e tendo em mira os pedidos de reconsideração formulados pela ELETRONORTE e pelo IBAMA, passo ao reexame da tutela de urgência postulada."

Dimensão do projeto - "A questão em exame é de suma relevância e transcende as margens do Rio Xingu, na região na qual é projetado o futuro empreendimento energético em questão. "De fato, o tema rompe as fronteiras não só deste município, mas também do Estado do Pará, revelando-se, em verdade, questão de interesse nacional. É discussão que certamente influenciará os anos vindouros do cotidiano nacional.

"Basta olhar o mapa do Rio Xingu para verificar que, o só fato de o mesmo cortar mais de um Estado já é suficiente para admitir-se que não se trata de uma questão meramente local."

Questão indígena - "Não pode este magistrado descuidar da apreciação da relevante questão indígena relacionada necessariamente à presente demanda. Tal análise, no entanto, não pode revestir-se de paixões cegas.

"Devo registrar que já estive in loco em algumas aldeias indígenas da região e não foi pequena a perplexidade com que verifiquei as condições a que são relegados nossos irmãos indígenas.

"O que se percebe, pelo menos nos locais em que estive, é que não há estrutura de apoio condizente com as necessidades dos povos indígenas. Assim, há, na prática, verdadeiro abandono destes brasileiros que são privados dos benefícios obtidos através de anos de pesquisa científicas e desenvolvimento tecnológico.

"Sob o pretexto de não serem "desvirtuados culturalmente" estas pessoas são, na prática, submetidas a condições precárias de habitação e saúde, não lhes sendo permitido sequer terem noção dos direitos que possuem."

Questão social - "O contexto social de Altamira é preocupante. Devido ao período do inverno amazônico, com a cheia do rio Xingu, milhares de desabrigados tiveram que abandonar suas casas e se alojar em acampamentos improvisados, sendo submetidos a toda sorte de transtornos, que certamente ofendem a necessária preservação da dignidade da pessoa humana.

"Mas o que esta situação tem haver com os presentes autos? Ocorre que, com a implantação da UHE Belo Monte, as famílias que atualmente se encontram em áreas sujeitas a alagamentos todos os anos poderão finalmente ser contempladas com uma casa em área segura, já que serão indenizadas pelas empresas empreendedoras. A medida representa sensível aumento da qualidade de vida de milhares de pessoas.

"A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Resolução 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, em seu Artigo I reza que "todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade", o que permite concluir que os alagados de Altamira também devem ser tratados com a mesma dignidade que deve ser destinada a quaisquer outros povos.

"Também é aspecto social relevante a observação de que o governo federal, quando do início das obras da abertura da transamazônica, fez ampla publicidade visando o deslocamento de milhares de brasileiros para esta região. Não pode este mesmo governo, que, volta e meia acena para o progresso local, abandonar seus cidadãos à própria sorte.

"Da mesma forma, não é idôneo fechar os olhos para um problema sério já sofrido no país. Os "apagões" revelaram-se, no passado próximo, verdadeiro tormento a milhões de brasileiros.

Como pode este Juízo não sopesar o fato de que o retardo no andamento do planejamento energético poderá fatalmente redundar em futuros "apagões"?

Aceitar passivamente o retorno dos ditos "apagões" é sentenciar de morte centenas de brasileiros que dependem da rede pública de saúde para sobreviver, muitas vezes em decorrência de doenças crônicas.

Em relação novamente à realidade local, também tenho em conta que a protelação dos estudos voltados para a efetivação (ou não) da UHE Belo Monte causa enorme inquietação fazendo com que milhares de pessoas literalmente percam o sono e vejam frustradas as possibilidades de materialização de seus sonhos de progresso da região e melhores condições de vida."

Carência de energia - "Não há como fechar os olhos para a questão. A demanda energética é um fato. Por isso é que a demora na conclusão sobre a viabilidade do projeto UHE Belo Monte apenas trará prejuízos estratégicos e financeiros ao país e aos milhões de consumidores, que certamente terão que arcar com os elevados custos das soluções provisórias que, deveras, são, em sua maioria, bem mais poluentes que a energia renovável obtida através de uma usina hidroelétrica.

"Não está aqui se afirmando que Belo Monte seria a panacéia para todos os males. Porém, forçoso é admitir-se que tal empreendimento reveste-se da mais alta importância no que tange a planta energética nacional. Isso, é claro, se constatada a viabilidade técnica/econômica/ambiental do projeto, nos moldes das condicionantes expressamente previstas no Decreto Legislativo nº. 788/2005, do Congresso Nacional."

Autorização legislativa - "Ainda que fossem desconsideradas as observações acima, deve-se ter em mente que, para os trabalhos atualmente desenvolvidos pelo Ibama e pela Eletrobrás, quais sejam, meros estudos e coleta de informações junto às comunidades do entorno, não se faz necessária qualquer autorização legislativa, vez que, conforme se depreende da leitura combinada dos art. 49, inciso XVI e 231, § 3º da CF, tal autorização é necessária apenas quando do início dos trabalhos relativos à construção do Aproveitamento Hidrelétrico Belo Monte.

"A Constituição apresenta redação límpida, determinando que o aproveitamento dos recursos hídricos, incluindo os potenciais energéticos, deve ser objeto de autorização por parte do Congresso Nacional.

Nada é mencionado quanto a simples estudos ou reuniões públicas. Nem faria sentido semelhante exigência, uma vez que seria desperdiçar o tempo precioso do Poder Legislativo com questões sem a menor relevância concreta, uma vez que análises e pesquisas sobre o tema não tem o condão de afetar o meio ambiente, tampouco as comunidades indígenas. Ao contrário, tem razão de ser justamente na preservação do meio ambiente e no respeito às populações interessadas."

Progresso e combate à criminalidade -"Arrematando, deixo registrado que não ignoro que a UHE Belo Monte, se vier a ser instalada, trará o progresso para esta região amazônica e com ele virão, também, os problemas naturais, decorrentes do considerável aumento da população. É imprescindível, pois, que todos os poderes constituídos, em todos os níveis federal, estadual e municipal, voltem seus olhos para a região e aqui incrementem suas estruturas físicas e de seu pessoal para combater o crime organizado, a grilagem de terras, a exploração ilegal da madeira, a invasão de terras indígenas, a corrupção, o desvio de recursos públicos, a criminalidade comum e todos os demais fatores da crise social, promovendo, ainda, a regularização fundiária, sendo esse último um dos mais graves problemas a serem enfrentados, já que, aqui, em passado não remoto, era comum simplesmente alguém chegar e ocupar uma grande área de terras públicas, degradá-la e, através da corrupção de agentes públicos, conseguir titularizar a terra, como se propriedade privada fosse."

Público e privado -"Além disso, o poder público e a iniciativa privada envolvida no empreendimento têm que assumir a responsabilidade de dotar a região de infra-estrutura, segurança, escolas, inclusive universidades, áreas residenciais, lazer, e assistência social e de saúde, sendo, no âmbito governamental, uma das principais ações o asfaltamento da Rodovia Transamazônica outro fator decisivo e inevitável de promoção do desenvolvimento da região. Também os movimentos sociais precisam ter assegurada a defesa de seus legítimos interesses, desde que o façam com respeito à propriedade pública e privada, à lei e à ordem."

Justiça Federal na região -"O Poder Judiciário Federal já está fazendo a sua parte, do que é exemplo a recente instalação da Vara Federal em Altamira, trazendo consigo o Ministério Público Federal e a Polícia Federal. A AGU, o IBAMA e o INCRA, precisão urgentemente reforçar as suas estruturas, entre outras ações, instalando suas representações judiciais em Altamira e aumentando o aparato de fiscalização. Nesse contexto, a Justiça Federal em Altamira tem plena consciência de suas graves responsabilidades e delas se desincumbirá, sempre que provocada, com vistas a, de um lado, fazer respeitar as liberdades públicas e, de outro, coibir os excessos, punir os criminosos, sejam eles quem for, agindo, enfim, na intransigente defesa do Estado Democrático de Direito, contribuindo, assim, para a estabilização e a paz social."


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