Mariliz Pereira Jorge
As críticas a Silvio Santos na ocasião de sua morte têm um ranço elitista e a manjada necessidade de alguns expoentes das redes sociais em posar de bastiões da moral e da democracia. Quem acompanha política sabe que o apresentador manteve relações cordiais com governantes autoritários, mas também com todos os presidentes da Nova República. Ressaltar esse aspecto de sua biografia, sem acrescentar nada ao debate, como se isso fosse maior do que o seu papel na história da comunicação do país, revela apenas vaidade e profundo desdém pela memória afetiva do público.
Posts e textos que circulam nas redes, cheios de indignação com as homenagens feitas a Silvio Santos, negam o valor e a importância da relação do apresentador e de sua audiência, reforçam estereótipos negativos sobre o espectador pobre e desumanizam as experiências vividas que moldaram a identidade de milhões de brasileiros. Isso tudo é, queiram ou não, maior do que a relação com a ditadura e os problemas crônicos de desconexão com os códigos sociais do mundo atual, que mostraram um Silvio Santos machista, racista, homofóbico. Todo mundo sabe disso, nem todo mundo se incomoda, basta ver a audiência de seus programas ao longo de décadas.
Quem frequenta redes sociais tem a falsa impressão de que o seu pequeno universo pode servir de termômetro para aferir o humor da população sobre determinado assunto. A depender da minha bolha, os posicionamentos políticos de Silvio Santos serão muito mais lembrados do que seu legado como comunicador.
Mas desde que saí do ex-Twitter, que o diabo o tenha, prefiro me basear pelo "datapovo". Nas conversas com o zelador, que é praticamente um vereador da minha rua, nos papos com taxistas e motoristas de apps, mas principalmente nas estatísticas da dona Graça, costureira aqui das redondezas. Segundo eles, Silvio Santos era um gênio, maior apresentador da TV, baita comunicador.
Fonte: Folha de São Paulo, 21/08/2024
por Iris Helena Gonçalves de Oliveira
Biblioteca
Justiça Federal de Goiás