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Publicações de Interesse Público

23/09/2024 -

Woody Allen deve ser aplaudido, não cancelado

 Woody Allen deve ser aplaudido, não cancelado

O cineasta Woody Allen nos bastidores do filme 'Golpe de Sorte em Paris' - Divulgação

Injustiça contra o cineasta mostra como misturar artista e obra pode levar a movimento de caça às bruxas

Lygia Maria  

 O cineasta Woody Allen lança mais um filme e, com ele, sempre vem à tona a questão: devemos condenar o trabalho de um artista porque ele não é uma pessoa moralmente exemplar? A resposta menos autoritária e mais sensata é não.

 Afinal, não é a vida do artista, mas sua arte, que nos acalma com beleza ou chacoalha emoções e ideias que temos sobre nós mesmos, nossos relacionamentos e o mundo. Se artistas têm alguma missão, seria a de "fazer com que as pessoas apreciem estar vivas pelo menos um pouco" —como disse o escritor Kurt Vonnegu.

 Entende-se quem tenha dificuldades para estabelecer essa divisão e faça escolhas pessoais sobre o que consumir. O problema surge quando tal comportamento vira movimento social persecutório com laivos moralistas. 

 É o que se vê no cancelamento. Grupos organizados clamam por boicote a artistas e ainda atacam o público que não segue a diretriz, como dizer que quem assiste aos filmes de Roman Polanski é cúmplice de estupro. 

 O cineasta de fato foi condenado e fugiu dos EUA para escapar da Justiça —mesmo assim, seu "O pianista" é uma obra prima.

No caso de Woody Allen, talvez o artista que mais tenha sofrido os efeitos nefastos do cancelamento, o suposto abuso sexual de sua filha nos anos 1990 foi ostensivamente investigado e nem sequer chegou a ir a julgamento porque constatou-se que o crime não ocorreu. Na verdade, surgiram fortes indícios de que sua ex-parceira, a atriz Mia Farrow, manipulou a criança para fazer a acusação.

 Assim, quando a questão da separação entre artista e obra escapa do âmbito da decisão individual e é manipulada para fins ideológicos, o que se tem é a paranoia autoritária da caça às bruxas. 

 No caso de Woody Allen, também não ajuda que o enredo de sua produção cinematográfica não seja político —outra obsessão do movimento identitário que rende financiamentos e prêmios em Hollywood. 

 Sua obra trata de questões existenciais, como o amor e a morte, que há milênios encantam e afligem a humanidade. Só por nos ajudar a enfrentar essa aflição, com humor e beleza, os filmes de Woody Allen merecem aplausos.

Fonte: Folha de São Paulo 23/09/2024
por Iris Helena Gonçalves de Oliveira

Biblioteca
Justiça Federal de Goiás


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