A Justiça Federal de Itaituba determinou que, até o dia 28 de fevereiro de 2022, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) inclua na pauta de quaisquer das reuniões de seu conselho consultivo o processo que trata do tombamento do patrimônio histórico, artístico e arquitetônico de Fordlândia, distrito de 2 mil habitantes pertencente ao município de Aveiro, na região oeste do Pará. Se houver pedido de vista, o processo deverá ser incluído na próxima reunião (ordinária ou extraordinária) até o dia 31 de março. A inscrição no livro de tombo deverá ocorrer até 31 de maio de 2022.
O processo de tombamento já tramita na área administrativa do Iphan há mais de 30 anos, o que levou o Ministério Púbico Federal (MPF) a ingressar, em 2015, com ação civil pública para acelerar procedimentos que garantam a preservação do patrimônio histórico do distrito. Fordlândia foi sede do empreendimento implantado nos anos 20 do século passado pelo magnata norte-americano Henry Ford (1863-1947), que pretendia fazer do local o centro que deveria suprir de borracha, exclusivamente, a nascente indústria automobilística nos Estados Unidos, então liderada pela Ford Motors.
No dia 6 de dezembro, o juiz federal substituto Domingos Daniel Moutinho, que responde pela Vara de Itaituba, fez uma inspeção judicial em Fordlândia e constatou, pessoalmente, a progressiva deterioração de boa parte do acerto histórico e arquitetônico do distrito. No dia seguinte, a Justiça Federal promoveu uma audiência pública, em que representantes do MPF, do Iphan, da Prefeitura de Aveiro e de vários outros órgãos, além de lideranças comunitárias, debateram o assunto.
Na mesma decisão (veja aqui a íntegra), em que estabeleceu prazos para o Iphan incluir o processo de tombamento na pauta de qualquer reunião de seu conselho consultivo, Moutinho determinou que os técnicos do Instituto deverão apresentar até 31 de julho de 2022, à população e às autoridades de Fordlândia, o plano de gestão e normatização do conjunto tombado.
Quanto ao município de Aveiro, a Justiça Federal mantém as medidas já determinada em liminar concedida em maio de 2016, visando preservar o que resta do acervo histórico do distrito. Também deverá ser juntado aos autos, até 28 de fevereiro, cópia integral do processo de licenciamento ambiental deferido em favor da Mineradora Tapajós, “para fins de que se afiram quais foram a condicionantes eventualmente impostas em seu curso e se tinham elas relação com a preservação da história de Fordlândia.” A empresa atua na área de extração, beneficiamento e comercialização de produtos oriundos da gipsita (matéria-prima do gesso).
O município também deverá incluir, em outro licenciamento que está em curso, condicionantes relativas à recuperação dos principais prédios históricos do distrito de Fordlândia, estando obrigada a fazer prova juntando o processo administrativo respectivo até o dia 31 de março. Caso descumpra essas medidas, será aplicada ao município multa diária no valor de R$ 2 mil.
“Afronta” - A decisão destaca que o processo administrativo para o tombamento do patrimônio histórico de Fordlândia foi instaurado no dia 14 de março de 1990 e, desde então, já enfrentou “prolongados hiatos sem qualquer movimentação, intercalados com a repetição indevida de atos e levantamentos, em flagrante afronta ao interesse público, seja ele primário ou secundário.”
Acrescenta o juiz que “se de um lado desperdiça-se o valoroso tempo do distrito de Fordlândia, que segue à míngua da proteção que se lhe deveria conferir, essa tramitação processual irracional também tem imposto ao Iphan, que não raramente manifesta ressentimento pela escassez orçamentária, grave desperdício de recursos públicos. É que, uma vez que o processo não acaba nunca, ao longo de seu curso são necessárias reiteradas atualizações dos registros presenciais acerca do acervo patrimonial de Fordlândia. Nem bem um levantamento é realizado, novamente o processo é paralisado e, quando já estaria ele pronto para análise pelo órgão consultivo, já não mais prestam os levantamentos então concluídos, de modo que necessitam ser atualizados”, reforça o magistrado.
“Isso custa muito dinheiro”, reforça Moutinho. “A cada ida de uma equipe ao local, são expendidos incalculáveis valores com diárias, passagens, materiais e infraestrutura. A leitura dos autos nos revela a ocorrência de, pelo menos, cinco levantamentos locais: a) o original, que instruía o pedido de tombamento na década de 90; b) um no ano de 2008, confeccionado por técnicos do Iphan; c e d) dois na década dos anos 2010 (um realizado pela técnica do Iphan e outro por empresa contratada); e) e mais um, recentemente, realizado no mesmo período da audiência pública.”