DANIEL SANTOS ROCHA SOBRAL
Diretor do Foro e Juiz Federal da 7ª Vara da Seção Judiciária do Pará, delegado da Ajufe-PA e vice-presidente da Ajufer
É com sentimento de profunda tristeza e indignação que assistimos, inertes, dia após dia, atos de selvageria ao próximo, os quais, de tão rotineiros, começam a passar despercebidos pela sociedade em geral.
O mais recente ato de selvageria, segundo maciças reportagens jornalísticas, ocorreu na madrugada do dia 12, na cidade do Rio de Janeiro, tendo como alvo a juíza de Direito da 4ª Vara Criminal de São Gonçalo, implacavelmente executada com pelo menos 15 tiros de pistolas calibres 40 e 45, tendo em conta sua firme atuação no combate á criminalidade.
Não se trata, é bom que se diga, de um assassinato qualquer, mais de um "tapa na cara" no Estado brasileiro, insensível e incapaz de proteger as suas próprias autoridades jurisdicionais, máxime quando escancaradamente ameaçadas de morte por conta de sua atividade jurisdicional.
Trata-se, à evidência, de um ato perverso, não só porque uma vida humana foi ceifada abreviadamente, mas porque, repise-se, essa morte foi levada a cabo em decorrência do exercício regular das atribuições constitucionais e legais da vítima (magistrada), revelando-se a não mais poder ameaça ao próprio Estado de Direito e à sociedade.
Infelizmente, e aqui cabe decantar aos quatro ventos, não se trata de caso isolado. Inúmeros foram os magistrados ceifados da vida dos seus e de seus afazeres simplesmente por terem resistido à criminalidade organizada, simplesmente por terem atuado de maneira independente, firme e imparcial.
Para piorar, dezenas de magistrados outros, inclusive federais, encontram-se ameaçados de morte, potencialmente elencados em uma “lista negra”, sem a mínima e satisfatória contrapartida do Estado, que, por questões pequenas, esquiva-se e/ou muitas das vezes não presta a necessária segurança, armamento, carros blindados, etc. necessários ao regular desempenho de tão nobres funções.
Prova dessa inércia estatal salta aos olhos ante a paralisação interminável e injustificável do Projeto de Lei Complementar nº 03/06, em tramitação no Congresso Nacional, olvidando Suas Excelências e o Governo Federal de dotar as autoridades judiciárias de mecanismos mínimos hábeis a contrabalançar o poderio criminoso (criação de polícia judiciária vinculada ao Poder Judiciário e órgão colegiado para julgamento de organizações criminosas e narcotráfico internacional), no que resta apequenado o Judiciário e, por conseqüência, a sociedade. Nesse contexto, sempre lúcido o ensinamento de Martin Luther King, para quem "o que mais preocupa não é o grito dos violentos, dos corruptos, mas o silêncio dos bons".
É passada a hora, pois, dos “bons” saírem do silêncio, refletindo serenamente acerca do Judiciário que realmente queremos; é passada a hora de findar a campanha midiática/sensacionalista de pleno descrédito aos magistrados; é passada a hora de se reconhecer que, ante a gravidade e relevância de suas funções, o Estado tem o dever-poder de sair da inércia, protegendo aqueles que fazem do seu mister o que há mais de sagrado, muitas vezes à custa da própria vida e/ou de seus familiares.
Encerro, enfim, estas breves e pesarosas linhas, com passagem de Dante Alighieri, a título de reflexão, para quem "os lugares mais quentes do inferno estão reservados para aqueles que, em tempos de crise moral, optam por ficar na tranqüilidade e na omissão".
Oxalá que nossas autoridades, de todos os poderes, não se digladiem na disputa de um espaço no andar de baixo.
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