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21/05/2007 15:03 -

Redução da maioridade penal

Redução da maioridade penal

ARTHUR PINHEIRO CHAVES

Juiz Federal Substituto da 1ª Vara da Seção Judiciária do Pará

A ocorrência recente de crimes amplamente divulgados e que chocaram a sociedade pela sua crueldade, com a participação de menores, destacando-se aquele que vitimou o pequeno João Hélio, um menino de 6 anos que morreu arrastado por 7 km, percorrendo quatro bairros do subúrbio do Rio de Janeiro, ou a possibilidade de volta às ruas de "Champinha", que quando menor assassinou cruelmente um casal de jovens paulistas, trouxe à baila a discussão acerca da redução da maioridade penal.

Atualmente a previsão dos 18 anos para a maioridade se encontra no Texto Constitucional, no art. 228, bem como no art. 27 do Código Penal Brasileiro. Essa última lei trata da questão ao regular a imputabilidade penal, presumindo, de forma absoluta, que o menor de 18 anos não apresenta um dos elementos da culpabilidade, qual seja, a imputabilidade. O menor de 18 anos é inimputável, ou seja, não tem a capacidade de entender o caráter ilícito do fato criminoso e nem de se determinar de acordo com esse entendimento para praticar o ato, ficando, por conseqüência, isento de pena. Adotou-se, na hipótese, o critério biológico para a definição da maioridade, levando em conta apenas o aspecto cronológico-etário, não importando o desenvolvimento psicológico do indivíduo.

O limite etário apontado, contudo, tem se mostrado insuficiente para coibir a criminalidade, servindo, ao contrário, para incentivar a marginalidade, através, por exemplo, do uso de menores por quadrilhas na prática de crimes, com a certeza da impunidade. Não se pode olvidar, entretanto, que o Código Penal é do início da década de quarenta, quando sequer havia televisão no Brasil. Hoje, por mais alijado que seja o cidadão do acesso aos bens materiais, a maioria dos lares brasileiros possui uma televisão, meio fácil e instantâneo de acesso à informação que influi na maturidade mais precoce da juventude. O jovem de 16 anos do ano de 2007 não é o jovem de 16 anos do ano de 1940, data em que surgiu o Código Penal vigente.

Hodiernamente se mostra inconcebível achar que um menor de 16 anos seja considerado, por presunção absoluta, incapaz de entender a gravidade da prática de um estupro, de um homicídio, latrocínio ou de uma extorsão mediante seqüestro, por exemplo. O argumento trazido por alguns, concernente ao aspecto social da "falta de oportunidade" de alguns jovens, o que influiria no seu entendimento, não serve.

A noção de que há fatos que atingem de forma mais agressiva os bens socialmente protegidos, como é o caso dos chamados crimes hediondos, não refoge ao entendimento de uma pessoa de 16 anos com desenvolvimento intelectual médio, com a noção do chamado homem médio ou bonus pater familiae, independentemente da classe social que ocupe ou do seu nível de instrução. É inerente ao convívio social. Pensar de outra forma é fechar os olhos para a realidade. Se um indivíduo com a referida idade não tem a noção da gravidade de tais fatos, não se espera que aos 18 anos a adquira. Nesse caso, parece que a hipótese de ausência de imputabilidade poderá ser outra, não guardando relação com a idade e sim com a doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, de que trata o art. 26 do Código Penal. De outra banda, o amadurecimento físico na idade acima referida (16 anos) se encontra praticamente completo, propiciando ao menor o uso de força física para a prática de violência no cometimento fatos tipificados como crimes, especialmente contra pessoas do sexo feminino.

A tendência de amadurecimento mais precoce, em face do transcurso do tempo e da evolução da sociedade, não passou despercebida do legislador, por exemplo, quando reduziu a maioridade civil para 18 anos, com o Código Civil de 2002 (art. 5º da Lei nº 10.406 , de 10 de janeiro de 2002 - Novo Código Civil). Em países mais avançados, como é o caso da Inglaterra, a questão é tratada de outra maneira, sendo que o menor de 10 anos pode ser responsabilizado penalmente.

É preciso que se encontre um meio termo e se adotem soluções. Se a redução da maioridade em relação à prática de todo e qualquer ilícito penal encontra maior resistência em sua aprovação, que se dê ao menos para alguns tipos de crimes que atingem de forma mais profunda o bem-estar social, como é o caso do homicídio, latrocínio, estupro ou extorsão mediante seqüestro, já mencionados acima.

Outra possibilidade é a de que o atual limite de três anos previsto pelo art. 121, parágrafo 3º do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente - Lei nº 8.069/1990) para o cumprimento de medida sócio-educativa de internação, que resulta na conseqüência de que um menor que cometa crime, por mais grave que seja, esteja livre aos 21 anos, seja aumentado, de forma a que o menor infrator possa ter sua liberdade restringida até um limite etário maior, sofrendo sanção proporcional ao ilícito praticado.

Muito se fala que o clamor público, resultante de determinado fato isolado, como o citado no início deste texto, relativo ao pequeno João Hélio, não pode servir de motivação para a efetivação de mudanças legislativas desse jaez, sob pena de afronta impensada a direitos relativos à garantia da liberdade. Trata-se, contudo, de meia-verdade. Não se pode olvidar que o conceito de preservação da liberdade, entendida da forma mais ampla possível, passa também pela possibilidade de o cidadão de bem poder viver e circular livremente em um ambiente social seguro. O clamor público, em verdade, reflete a realidade e os anseios sociais de determinada época, devendo, portanto, ter ressonância no Congresso Nacional de um país, que nada mais é a que a representação da sociedade na função de legislar, sendo seus integrantes mandatários a espelhar o meio social em rebuliço. Como, então, deixar de refletir tal realidade?

É preciso, portanto, mudança, sob pena de incentivo à criminalidade e de forma a se evitar que outros Joões Hélios sofram barbáries, sem maiores conseqüências para o menor infrator, ou que novos "Champinhas" tenham a possibilidade de voltar às ruas rápido demais, deixando na sociedade a sensação amarga de indignação, insegurança e impunidade.

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