Sentença (veja a íntegra) do juiz federal Carlos Henrique Borlido Haddad, da Subseção de Marabá, condenou a Vale a repassar mensalmente mais de R$ 650 mil a duas comunidades indígenas que habitam a região sul do Pará. Além disso, também está obrigada a reparar uma estrada que liga aldeias indígenas. A decisão é um julgamento de mérito em ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Fundação Nacional do Índio (Funai) contra a empresa.
Os recursos, segundo a sentença judicial, deverão ser despendidos pela mineradora até que seja implantado um novo modelo de gestão da comunidade indígena Xikrin e que os próprios índios alcancem a autonomia financeira. Da sentença cabe recurso ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília (DF).
Em dezembro de 2006, em ação cautelar que precedeu a ação civil pública agora julgada, o mesmo magistrado concedeu medida liminar determinando que a Vale restabelecesse recursos que vinha transferindo à comunidade Xikrin, no valor mensal de R$ 569.915,89, sendo R$ 243.578,29 destinados aos xikrins do Cateté e R$ 353.337,60 aos xikrins do Djudjekô.
Na sentença de agora, Carlos Henrique Haddad corrige os valores anteriormente calculados. Os xikrins da Aldeia Cateté terão direito a receber todo mês R$ 268.054,62, enquanto os xikrins do Djudjekô receberão R$ 388.843,27, “até ulterior deliberação deste juízo, sem prejuízo de aportes excepcionais de recursos para implementação de providências evidentemente necessárias.”
A sentença de Haddad esclarece que, enquanto não for implantado o novo modelo de gestão da Vale para as duas comunidades, incidirá acréscimo mensal sobre os recursos a serem repassados, no valor de R$ 10 mil, em caráter cumulativo, a partir do segundo depósito realizado após a publicação da sentença. Do dinheiro a ser recebido pelas duas comunidades indígenas, ficarão retidos R$ 20 mil, em caráter cumulativo, para estimular a rápida execução da sentença. “Ao final, será dada destinação aos valores que permanecerem retidos”, complementa o juiz.
Rodovia - Na mesma decisão, o juiz federal de Marabá condenou a Vale a recuperar a estrada indígena PA-279 PVK/Aldeia Djudjekô/Catete/Bekware, com extensão de 160 km. O magistrado deixou a critério da ré executar ou subcontratar a reforma da estrada ou depositar, em 15 dias, o valor de R$ 910.140,31, atualizado monetariamente e acrescido de juros de mora de 1% ao mês até agora, a contar do momento em que a Vale for citada. Se o depósito não for feito em 15 dias ou a execução das obras não for mantida até a sua conclusão, a Vale ficará sujeita à cobrança de R$ 100 mil, “a cada 15 dias de inércia da ré.”
Para o juiz federal, compete à Vale amparar as populações indígenas existentes nas proximidades da área que explora, de acordo com os termos de convênio formalizado com a Funai. A empresa, segundo o magistrado, “tem a obrigação de prestar assistência às comunidades indígenas”, o que vinha sendo feito, durante anos, com o repasse de recursos financeiros, para atender a regulamentação contida em decreto de março de 1997.
O magistrado ressalta que, ao contrário do que defendem os advogados da Vale, a mineradora “goza do direito real de uso da área que explora em Carajás. Borlido extrai dados disponíveis no próprio site da empresa. Ao informar o público sobre o Projeto Ferro Carajás, diz a mineradora, segundo seu site: “Em 1986, a União concedeu à CVRD - então uma empresa estatal e detentora dos direitos minerários em Carajás - o direito real de uso dos 411 mil hectares adjacentes à Província Mineral de Carajás, cabendo-lhe sua preservação”. Acrescenta o juiz: “Essa é a realidade experimentada: beneficia-se a ré com direito real de uso concedido pela União.”
Para o magistrado, diante desse quadro, ou deve ser desconsiderado o título que autoriza a Vale a utilizar gratuitamente as terras da União, assim como das eventuais obrigações impostas à empresa, ou então o reconhecimento do direito real de uso da mineradora, bem como das obrigações, direitos e deveres daí decorrentes.