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16/06/2008 17:57 -

União terá que indenizar família de militar morto no Ciaba

União terá que indenizar família de militar morto no Ciaba

A União Federal foi condenada a pagar R$ 140 mil de indenização por danos morais à família do soldado Marcelo Magno Alves Almeida, que morreu no dia 30 de março de 2006, quando participava de treinamento na piscina do Centro de Instruções Almirante Brás de Aguiar (Ciaba). A sentença, de 20 laudas (veja aqui a íntegra), é da juíza federal Hind Ghassan Kayath, da 2ª Vara.

Sobre o valor de R$ 140 mil arbitrados na sentença deverão incidir ainda atualização monetária a partir da data em que a sentença foi proferida e juros moratórios fixados em 1% ao mês, a partir da data em que o soldado morreu. Da decisão judicial cabe recurso ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com sede em Brasília (DF).

Marcelo Almeida morreu quando participava do treinamento denominado “Expedito de Operações Ribeirinhas”. A petição inicial explica que, na ocasião em que ocorreram os incidentes que o levaram à morte, o soldado, além de portar uniforme, mochila e fuzil, com peso total de quase 25 quilos, teria sido submetido a treinamento excessivo com requintes de crueldade e agressões, conforme relatório de verificação de óbito emitido pelo Instituto Médico-Legal (IML).

Esse tipo de treinamento, que os fuzileiros da Marinha chamam de “caldo”, consistiria em mergulho forçado para impedir o indivíduo de respirar pelo máximo de tempo possível, o que ficou comprovado, segundo a sentença, por depoimentos que constam dos autos do inquérito policial militar (IPM) e do relatório do IML, no qual foi apontada a existência de manchas na região do dorso e pescoço.

Além disso, segundo sustentaram os pais de Marcelo na ação que propuseram perante a 2ª Vara, não havia nas dependências do Ciaba equipamento adequado para pronto atendimento médico, o que só ocorreu com a chegada do Serviço de Atendimento Médico de Urgência do Município (Samu), e assim mesmo quando o soldado já havia falecido.

Os pais de Marcelo invocaram a responsabilidade civil do Estado, argumentando que quando o soldado ingressou no Corpo de Fuzileiros Navais, os exames a que teria sido submetido foram ineficazes para diagnosticar anomalia cardíaca denominada “insuficiência de válvula tricúspide, com dilatação cardíaca e insuficiência compensada.”

Essa doença, de acordo com o laudo do IML, é que teria levado Marcelo à morte, fato que, conforme a sentença, revela a negligência da Marinha de Guerra em aplicar exames inadequados na avaliação de seu pessoal sujeito a treinamento intensivo e exaustivo.

Na sentença, a juíza da 2ª Vara classifica de “abundantes” as provas juntadas ao processo, no que se refere à conduta de agentes da Marinha que levaram o soldado à morte. Tais provas, colhidas em depoimentos prestados em juízo e no IPM, bem como nas conclusões do laudo do IML, dão conta de que o soldado, ainda que portador de moléstia cardíaca antecedente à sua entrada para a Marinha, “sofreu de fato agressões durante o treinamento a que foi submetido na data de seu falecimento, as quais, a teor dos elementos carreados aos autos, excederam a mera disciplina militar inerente ao serviço militar e foram determinantes para sua morte.”

A sentença ressalta que outros soldados que testemunharam os fatos e confirmaram as agressões teriam, à época, “sofrido pressões para modificar suas declarações iniciais”. A juíza diz, no entanto, que mesmo com a posterior retratação de alguns militares, “o conjunto dos fatos narrados apresenta-se bastante sólido, reforçado ainda de forma inconteste pelos depoimentos prestados em juízo e pelo laudo do IML.”

Juíza rejeita argumento da União para eximir-se de responsabilidades

A juíza federal Hind Kayath, da 2ª Vara, não acolheu o argumento da União Federal sobre a inexistência de nexo de causalidade entre a morte do soldado e qualquer conduta por parte de seus agentes. A União, para sustentar tal argumento, invocou em seu favor o fato de Marcelo Almeida ser portador de doença cardíaca que seria desconhecida pela Marinha e pelos próprios autores da ação, doença que teria provocado o mal súbito durante o treinamento e, em conseqüência, a morte.

Lembra a juíza que, apesar das conclusões do IML, o militar não havia apresentado no serviço ativo qualquer indício de que fosse portador de insuficiência cardíaca, até a data de seu falecimento. Ao contrário, acrescenta a magistrada, Marcelo foi considerado até mesmo “um bom nadador, tendo feito o tempo de 1 minuto e 47 segundos, quando nadou cem metros, na última prova de natação do teste de aptidão física que fez em 20 de outubro de 2005.

Referiu-se à magistrado a dado que consta do inquérito policial e foi decisivo, segunda ela, para rejeita a tese de falecimento em decorrência de mal súbito sustentada pela União. Trata-se do resultado dos laudos de exames periciais em que dois cardiologistas nomeados pela Marinha afastaram a possibilidade de que o edema que vitimou o soldado fosse decorrente de sua insuficiência cardíaca.

Hind Kayath não concedeu indenização por danos materiais, conforme também haviam pedido os autores da ação, porque a Marinha do Brasil já concedeu, administrativamente, a pensão por morte em favor dos pais do militar. Esse fato, esclarece a sentença, por si só compreende a indenização por danos materiais.

Quanto à indenização por danos morais, a juíza considerou plenamente cabível, se consideradas as perturbações à esfera psíquica experimentadas pelos autores da ação, pais de Marcelo. “Ora, em se tratando do falecimento de um filho, ainda jovem, e ainda nas condições relatadas nos autos, isto é, em meio a intenso sofrimento físico e mental, são inegáveis os reflexos negativos acarretados à esfera psíquica dos autores, os quais restaram brutalmente privados do convívio de seu único filho homem sem justificativa racional apta a ser aceita pelo homem médio e levá-lo à conformação com o ocorrido. Ademais, a conduta perpetrada pelos agentes da União apresenta altíssima reprovabilidade social, devendo, portanto, ser considerada gravíssima, uma vez que atentou contra o bem maior do ser - humano, isto é, a vida”, afirma a juíza.


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