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26/08/2021 08:50 - INSTITUCIONAL

Especialistas debatem direitos humanos das pessoas com deficiência em webinário promovido pela Esmaf

INSTITUCIONAL: Especialistas debatem direitos humanos das pessoas com deficiência em webinário promovido pela Esmaf

A Escola de Magistratura Federal da 1ª Região (Esmaf) realizou, nessa quarta-feira, dia 25 de agosto, o webinário “De Ximenes Lopes ao Estatuto da Pessoa com Deficiência: Um caminhar pela dignidade e autonomia”, com a participação de magistrados e especialistas em saúde mental e direitos da pessoa com deficiência. Este foi o 12° encontro da série on-line “Diálogos Jurídicos com a Magistratura Federal”.

Coordenadora do evento, a juíza federal Katia Balbino, titular da 3ª Vara Federal da Seção Judiciária do DF (SJDF) e especializada em saúde pública, abriu o webinário destacando a instituição, pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), da Unidade de Monitoramento e Fiscalização de decisões e deliberações da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), por meio da Resolução CNJ 364/2021.

A magistrada ressaltou que o normativo foi criado por conta da sentença da CIDH de 4 de julho de 2006, que condenou o Brasil pela violação dos direitos humanos de Damião Ximenes Lopes, vítima de tortura, que morreu em 4 de outubro de 1999, na Casa de Repouso Guararapes, onde estava internado devido à condição mental.

O objetivo, segundo a juíza, foi “o cumprimento integral do Ponto Resolutivo 8 da sentença que estabeleceu que o Estado brasileiro deve continuar a desenvolver um programa de formação e qualificação para psiquiatras, psicólogos, enfermeiros e outros profissionais de saúde mental, em especial sobre os princípios que regem o trato das pessoas com deficiência mental, conforme os padrões internacionais sobre a matéria”.

Ximenes Lopes - Iniciando os debates, o professor Thiago Borges, doutor em Direito Internacional e em Jurisdição Constitucional e Novos Direitos, falou sobre o funcionamento do sistema interamericano de direitos humanos, com base no caso Ximenes Lopes.

Ele explicou que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos não é um órgão judicial, mas administrativo da Organização dos Estados Americanos (OEA), voltado para a proteção dos direitos humanos. “É um órgão politicamente muito forte e que tem a responsabilidade de dar uma acessibilidade comunicativa à sociedade. Não há uma acessibilidade direta à CIDH. Os particulares e ONGs não podem acessar à Corte, só podem acessar à Comissão e aos estados membros, portanto, a Comissão é a via de entrada da sociedade no sistema”, disse o especialista.

No caso de Daniel Ximenes Lopes, explicou o professor, em novembro de 1999, a Comissão acolheu um juízo de admissibilidade da petição contra o Brasil e solicitou informações ao Estado brasileiro, mas não obteve resposta e, três anos depois, emitiu um relatório de inquérito condenando o Brasil, pela violação de direitos humanos.

Como o Brasil não adotou as recomendações da Comissão, o caso foi submetido à Corte Interamericana de Direitos Humanos em 2004. Durante o julgamento, o Estado brasileiro reconheceu sua responsabilidade internacional pela violação dos artigos 4º, relativo ao direito à vida, e 5º, relativo à integridade pessoal. No entanto, não reconheceu o pedido de reparação das vítimas e nem a violação de garantias judiciais e de proteção judicial. A Corte, em 2006, proferiu a sentença condenatória.

“No caso da saúde como um bem público, ainda mais envolvendo uma pessoa com deficiência, que é dotada de vulnerabilidade, o Estado tem o dever de regulamentar e fiscalizar toda a assistência prestada a essas pessoas, independentemente de ser uma entidade pública ou privada”, observou o professor doutor.

Violações - O professor Maurício Requião, doutor em Direito das Relações Sociais, ressaltou que o caso de Damião Ximenes Lopes não foi um caso isolado no País e nem o mais famoso. A situação com maior notoriedade se refere ao Hospital Colônia de Barbacena, em Minas Gerais, alvo de denúncias desde a década de 70.

“Por muito tempo, o Brasil teve como padrão um tratamento manicomial. A ideia de que a pessoa com deficiência mental precisava ser isolada da sociedade, excluída do convívio social. Mesmo havendo esse padrão, nada justifica o que aconteceu nesse hospital e talvez ainda aconteça nessas instituições”, alertou o especialista.
Requião explicou que esse cenário culminou na luta antimanicomial, na reforma psiquiátrica, que aconteceu também em outros países, e na Lei 2.216/2001, que dispõe sobre as pessoas com transtorno mental e modifica o sistema do modelo assistencial de saúde mental.

“Tivemos uma mudança no modelo geral de saúde mental, a internação sai como modelo padrão. Ela até pode acontecer, mas leva em consideração situações específicas para um modelo ambulatorial. A ideia passa a ser a convivência da pessoa com deficiência mental com a sociedade”, contou o professor.

“Ser normal” - O psicanalista, psiquiatra e membro da Associação Mundial de Psicanálise (AMP), Marcelo Veras, declarou que é muito simpático ao termo loucura.

“Não existe ninguém normal. Acho que todo mundo é meio louco. Como já dizia Caetano: de perto, ninguém é normal. Ser normal em um mundo como hoje tem algo inquietante. Quando eu vejo alguém muito feliz ou achando que tudo está normal, eu falo que tem uma negação grave acontecendo e é preciso refletir sobre isso, o poder da negação que pode chegar a um ceticismo e a uma crença em falsas verdades ou delirantes”, disse o médico.

Segundo o psiquiatra, não há como pensar a psiquiatria brasileira sem pensar nas intersetorialidades que são, principalmente, gênero, raça e racismo. “Ou seja, o sofrimento que a gente percebe da loucura e maus tratos ainda são extremamente ligados à população negra, que não tem apoio financeiro, apoio complementar. Não se pode pensar só no louco, mas no ambiente em que ele vive, na família, que às vezes quer interná-lo porque não tem apoio nenhum do Estado”, alertou.

Marcelo destacou, ainda, a importância da Caravana de Direitos Humanos que correu o Brasil verificando a situação dos asilos, hospitais psiquiátricos e de custódia e que denunciou situações terríveis nesses locais.

Reflexões - O vice-coordenador do webinário e especialista em saúde pública, juiz federal Marcelo Albernaz, destacou que esse é um tema que gera profundas reflexões, principalmente sobre como a pessoa que tem alguma deficiência, especialmente mental, deve ser tratada pela sociedade e pelo Direito.

“A realidade precisa ser continuamente vigiada e transformada, para assegurar a dignidade, a igualdade, a cidadania, a inserção social e a autonomia a todas as pessoas, independentemente de suas particularidades. Não devem existir seres humanos de categoria diferente em termos de dignidade, todos somos simplesmente seres humanos e ponto”, refletiu o magistrado.

Por fim, a juíza federal Katia Balbino, enfatizou que o debate mostrou que é preciso se aprofundar cada vez mais nesse tema, que, apesar de ter muitas esferas tristes, é preciso ser tratado.

A série “Diálogos Jurídicos com a Magistratura Federal” tem como coordenadores-gerais: o diretor da Esmaf, desembargador federal Souza Prudente; o vice-diretor da Escola, desembargador federal Wilson Alves de Souza, e o coordenador pedagógico da Esmaf, juiz federal Pedro Felipe de Oliveira Santos.

Veja a íntegra do evento no canal da Esmaf no YouTube.

PG/LS

Assessoria de Comunicação Social
Tribunal Regional Federal da 1ª Região


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